Laycer Tomaz/ Agência Câmara A foto mostra os manifestantes contra a redução da maioridade penal. |
Por 42 votos a favor e 17 contra, comissão considerou constitucional o projeto que reduz a maioridade de 18 para 16 anos. Texto segue para comissão especial
A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara aprovou nesta terça-feira 31 o voto em separado do deputado Marcos Rogério (PDT-RO), favorável à admissibilidade da PEC 171/93, que reduz a maioridade penal de 18 para 16 anos. Foram 42 votos a favor e 17 contra. O resultado gerou protesto de manifestantes presentes na reunião.
Antes, havia sido rejeitado o relatório do Luiz Couto (PT-PB), contrário à proposta de redução da maioridade penal. Couto argumentou que o projeto fere cláusula pétrea da Constituição, o que a tornaria inconstitucional.
No parecer vencedor, Marcos Rogério afirma que a redução da maioridade penal “tem como objetivo evitar que jovens cometam crimes na certeza da impunidade”. Ele defendeu que a idade para a imputação penal não é imutável. "Não entendo que o preceito a ser mudado seja uma cláusula pétrea, porque esse é um direito que muda na sociedade, dentro de certos limites, e que pode ser estudado pelos deputados", disse.
O deputado Alessandro Molon (PT-RJ), por sua vez, lamentou o resultado: “Estamos decidindo mandar para um sistema falido, com altíssimas taxas de reincidência, adolescentes que a sociedade quer supostamente recuperar. É um enorme contrassenso.”
PT, Psol, PPS, PSB e PCdoB votaram contra a proposta. Os partidos favoráveis à aprovação da admissibilidade foram PSDB, PSD, PR, DEM, PRB, PTC, PV, PTN, PMN, PRP, PSDC, PRTB. Já os que liberaram suas bancadas porque havia deputados contra e a favor foram os seguintes: PMDB, PP, PTB, PSC, SD, Pros, PHS, PDT, e PEN.
Tramitação
No exame da admissibilidade, a CCJ analisa apenas a constitucionalidade, a legalidade e a técnica legislativa da PEC. Agora, a Câmara criará uma comissão especial para examinar o conteúdo da proposta, juntamente com 46 emendasapresentadas nos últimos 22 anos, desde que a proposta original passou a tramitar na Casa.
Painel com o resultado da votação sobre a admissibilidade da PEC 171/93 na Comissão de Constituição e Justiça e Cidadania da Câmara
A comissão especial terá o prazo de 40 sessões do Plenário para dar seu parecer. Depois, a PEC deverá ser votada pelo Plenário da Câmara em dois turnos. Para ser aprovada, precisa de pelo menos 308 votos (3/5 dos deputados) em cada uma das votações.
Depois de aprovada na Câmara, a PEC seguirá para o Senado, onde será analisada pela Comissão de Constituição e Justiça e depois pelo Plenário, onde precisa ser votada novamente em dois turnos.
Se o Senado aprovar o texto como o recebeu da Câmara, a emenda é promulgada pelas Mesas da Câmara e do Senado. Se o texto for alterado, volta para a Câmara, para ser votado novamente. Não cabe veto da Presidência da República pois se trata de emenda à Constituição. A redução, se aprovada, pode ser questionada no Supremo Tribunal Federal, responsável último pela análise da constitucionalidade das leis.
Mais prisão significa menos crime?
Para a subprocuradora-geral da República, Raquel Elias Ferreira Dodge, há uma má interpretação dos índices de violência cometidos por jovens. "Há uma sensação social de descontrole que é irreal. Os menores que cometem crimes violentos estão ou nas grandes periferias ou na rota do tráfico de drogas e são vítimas dessa realidade", diz. Atualmente, roubos e atividades relacionadas ao tráfico de drogas representam 38% e 27% dos atos infracionais, respectivamente, de acordo com o levantamento da Secretaria Nacional de Promoção dos Direitos da Crianças e do Adolescentes. Já os homicídios não chegam a 1% dos crimes cometidos entre jovens de 16 e 18 anos. Segundo a Unicef, o Fundo das Nações Unidas para a Infância da ONU, dos 21 milhões de adolescentes brasileiros, apenas 0,013% cometeu atos contra a vida.
Ao mesmo tempo, não há comprovação de que a redução da maioridade penal contribua para a redução da criminalidade. Do total de homicídios cometidos no Brasil nos últimos 20 anos, apenas 3% foram realizados por adolescentes. O número é ainda menor em 2013, quando apenas 0,5% dos homicídios foram causados por menores. Por outro lado, são os jovens (de 15 a 29 anos) as maiores vítimas da violência. Em 2012, entre os 56 mil homicídios em solo brasileiro, 30 mil eram jovens, em sua maioria negros e pobres.
Por isso, para a subprocuradora-geral da República, o remédio para essa situação não é a redução da idade penal, mas o endurecimento da pena para adultos que corrompem menores – como o Projeto de Lei 508/2015, do deputado Major Olímpio – e o investimento em políticas sociais para os jovens.
Entidades como a Unicef, a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), o Ministério Público Federal (MPF), a Anced (Associação Nacional dos Centros de Defesa dos Direitos da Criança e Adolescente), o Ministério da Justiça e a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República (SDH) já se manifestaram contrários ao projeto.
Crise do sistema penitenciário
No modelo atual, de maioridade fixada em 18 anos, os jovens infratores representam 8% do número total da população carcerária adulta (715.655, incluindo as prisões domiciliares) e padecem das mesmas mazelas que afeta o sistema prisional adulto. A Fundação Casa, entidade responsável pelos menores infratores em São Paulo, é exemplo do caos. Em maio, CartaCapital revelou com exclusividade que um terço das unidades da Fundação Casa tem superlotação. A situação é tão crítica que, em agosto passado, o Ministério Público denunciou o governo Geraldo Alckmin (PSDB) e a Fundação Casa por conta da superlotação. Em fevereiro deste ano, promotores de Justiça criticaram o fracasso de gestão do governo de São Paulo no atendimento a menores infratores e publicaram carta aberta intitulada "A falência da Fundação Casa".
Por conta de situações como a de São Paulo, em vez de passarem por um processo socioeducativo de correção, a esmagadora maioria dos menores infratores vive em reclusão e sem atividades psicoeducativas para a reintegração social. À superlotaçãosomam-se denúncias de maus tratos, que resultam em uma reincidência de cerca de 43% dos menores presos, de acordo com Conselho Nacional de Justiça. Para o coordenador do Programa Cidadania dos Adolescentes do Unicef no Brasil, Mário Volpi, seria necessário o Estado brasileiro pensar em alternativas viáveis para cuidar de seus jovens. "Se prender não é uma medida eficaz para que o jovem não volte a cometer infrações, resta pensar em soluções para que ele não entre no mundo do crime", diz.
*Com informações da Agência Câmara
Fonte:http://www.cartacapital.com.br/