domingo, 5 de março de 2017

Mulheres com Deficiência e a Reforma da Previdência.


No Brasil, as mulheres com deficiência somam mais de 25 milhões (IBGE, 2010), residentes no campo e na cidade, sendo que a maioria habita e trabalha nas zonas urbanas.

A Proposta de Emenda Constitucional nº 287 (PEC da Previdência) suprime o direito concedido às mulheres de se aposentarem com cinco anos a menos do que os homens, em todos os casos, tanto na idade quanto no tempo de contribuição. Esta proposta não está considerando as especificidades das mulheres, muito menos da mulher com deficiência, pois estas são as mais desfavorecidas no mercado de trabalho, possuindo maiores dificuldades nos acessos aos serviços públicos e privados e nas mais diversas áreas: saúde, educação, qualificação profissional, etc.
Segundo estudos científicos, as mulheres trabalham mais (54,7 horas semanais) que os homens (46,7 horas semanais), 8 h/semana, que somam 73 dias a mais, em um ano, e até os 65 anos, a mulher trabalha 9 anos a mais. A reforma da previdência desconsidera completamente o dia a dia de uma mulher com deficiência que cria seus filhos, estuda e trabalha 44 horas semanais no ambiente de trabalho e tem de continuar sua jornada em casa, diante dos afazeres domésticos, cumprindo, assim, uma dupla jornada.
Enfrentamos inúmeras barreiras sociais que vulnerabilizam a mulher com deficiência. Essa desigualdade social não pode ser ignorada!
A eliminação da diferença de cinco anos de idade para a aposentadoria da trabalhadora rural, igualando as condições com as da trabalhadora urbana é outra perversidade da PEC287. A mesma ainda propõe a proibição em receber aposentadoria e pensão conjuntamente, tendo a mulher com deficiência optar pela mais “vantajosa”, quando a percepção das duas rendas é imprescindível para a manutenção da qualidade de vida, até então garantida pelo recebimento dessas rendas.

A aposentadoria, com esta reforma, se torna “parcial” e teria patamar inicial de 76%; mas, para alcançar a “aposentadoria integral” (100% da Remuneração), será preciso combinar 65 anos de idade e 49 anos de contribuição. Todos estes impactos serão mais pesados sobre a mulher com deficiência, e pior para àquelas de baixa renda, como as trabalhadoras rurais que dependem da aposentadoria com a pensão deixada pelos seus cônjuges para continuar mantendo a família (no máximo um salário mínimo cada).

Observa-se que a reforma da previdência acaba, praticamente, com as atuais garantias da aposentadoria especial da pessoa com deficiência, garantida pela LC 142/2013. Entre outras medidas, a atual aposentadoria especial garante às mulheres com deficiência sua percepção aos 20 (vinte) anos de contribuição, sem o critério de idade mínima (mulheres com deficiência de nível grave), ou por idade, aos 55 anos desde que com a contribuição de 15 anos. Mas, com a PEC287, mesmo fazendo jus ao direito, só poderá se aposentar aos 55 anos de idade, e com 20 de contribuição.

Outro caso importante para a mulher com deficiência é o Benefício de Prestação Continuada (BPC) que hoje beneficia 4 milhões de famílias (16 milhões de pessoas), tanto para mulheres com deficiência como para mulheres idosas, com mais de 65 anos, garantindo renda mensal de um salário mínimo. Na Reforma da Previdência, a idade mínima da mulher com deficiência para receber o BPC, que não possui os 15 anos de contribuição, sobe para 70 anos, lembrando que este benefício é para as idosos e pessoas com deficiência socialmente mais vulneráveis (renda familiar per capita de até ¼ do salário mínimo). Com isso, idosas com deficiência que aos 65 anos não conseguirem se aposentar (por possuírem menos de 25 anos de contribuição) precisarão sobreviver até os 70 anos sem qualquer benefício que lhes garanta renda justa. Além disso todos os benefícios serão desvinculados do salário mínimo.

Manter estas diferenças de idades para a aposentadoria é uma questão de justiça social.
A Constituição Federal de 1988, no capítulo II, Art. 194, que trata da Seguridade Social, assegura os direitos de acesso à saúde, à previdência e à assistência social. A falta destas políticas atinge diretamente as mulheres com deficiência que estão mais vulneráveis ao não ter acessos a estes serviços.
Por tudo isso, se essa reforma for aprovada, nós mulheres com deficiência sofreremos um retrocesso sem precedentes dos nossos direitos, e, embora pagantes da contribuição previdenciária por todo o tempo de trabalho, perderemos nosso dinheiro também, pois dificilmente vamos poder gozar de uma vida digna com uma aposentadoria justa.


Escrito:
Carolina Santos
Ewelin Monica Parturi Navarro Canizares
Liza Cenci

Grupo Inclusivass


Referências
1 - “Previdência: Reformar par Excluir?”, DIEESE, ANFIP e Fundação ANFIP de Estudos da Seguridade Social e Tributário, 2017, disponível em:http://plataformapoliticasocial.com.br/…/Documento_Completo…, acessado em 22/02/2017.
2 - Entrevista do economista Guilherme Costa Delgado feita por Débora Melo da Revista Cata Capital em 04/02/2016, disponível em :http://www.ihu.unisinos.br/…/551430-reforma-da-previdencia-…, acessado em 22/02/2017.
3 - Quadro comparativo comentado da PEC 287/2016, sobre a reforma da previdência, com a legislação atual, disponível em: http://www.anfip.org.br/…/d57538e299306234589027f6461aefcb.…, acessado em 22/02/2017.
4 - “Reforma da Previdência será alterada por pressão popular, diz diretor do Diap”, entrevista do Diretor do Departamento Intersidincal de Assessoria Parlamentar, Antônio Augusto de Queiróz para o Portal Congresso em Foco, em 20/02/2017, disponível em:http://congressoemfoco.uol.com.br/…/reforma-da-previdencia…/; acessado em 22/02/2017.
5 - “Uma população Adoecida: os efeitos da PEC 287 para a saúde do trabalhador”, entrevista da médica Maria Moeno ao Portal Previdência Mitos e Verdades”, disponível em: http://previdenciabrasil.info/uma-populacao-adoecida-os-ef…/, acessado em 22/02/2017
6 - “NOTA PÚBLICA CONTRA A REDAÇÃO DA PEC 287/16” do Conselho Federal do Instituto dos Advogados Previdenciários - IAPE, disponível em:http://site.iape.com.br/wp-conte…/uploads/…/01/NOTA_IAPE.pdf, acesssado em 22/02/2017
7 - “Considerações sobre a reforma da previdência - PEC 287/2016”, Fernanda Sales do Nascimento, 12/2016, Portal JUS.COM.BR, disponível em: https://jus.com.br/…/consideracoes-sobre-a-reforma-da-previ…, acessado em 22/02/2017.
8- Constituição Federal de 1988: