A dicotomia Depilação – Feminismo tem sido debatida, desde há um tempo a esta parte. Exemplos disso são algumas das postagens em páginas feministas brasileiras, e até já alguns média portugueses abordaram a questão, aquando do surgimento da “moda” dos pelos coloridos nas axilas.
Há quem considere incompatível fazer depilação e ser feminista, e há ainda quem seja da opinião de que não se é menos feminista por tratarmos o nosso corpo do modo que queremos, fazendo com que o tão conhecido lema my body, my rules (“o meu corpo, as minhas regras”) ganhe sentido. Mas se tudo isto ainda te deixa confusa e não tens a certeza da (in)compatibilidade entre feminismo e depilação,espero esclarecer-te com este artigo.
“Os pêlos do meu corpo dão-me o poder de gostar de mim própria. O meu corpo, as minhas regras”
Em primeiro lugar, importa perceber que esta “coisa” da depilação, não é recente. Surpreendida? Pois bem: em mulheres, tornou-se normal a remoção das pilosidades corporais ainda em 4.000 a.C., e em homens, costa que em 1.500 a.C. já se depilavam.
No entanto, a depilação enquanto imposição social, é algo recente, caindo – maioritariamente – sobre as mulheres, algo que tem vindo a tornar-se cada vez mais óbvio para todas nós. Atualmente, pelos num homem não passam disso mesmo: pelos. E quanto às mulheres? Bem, todas sabemos que o patriarcado demoniza os pêlos nas mulheres, ora porque “é nojento”, ora porque “é pouco feminino”, ora porque “é falta de higiene”.
Mas porquê esta abominação dos pêlos femininos? Cynthia Semíramis, mestre em direito e investigadora da História dos Direitos das mulheres, explica, numa entrevista ao jornal brasileiro
O Tempo – que podes ver aqui -, o que pode até parecer óbvio, mas nunca é demais compreendermos. Segundo a investigadora, a sociedade segue-se atualmente por padrões binários: Existem aspetos marcada e assumidamente femininos, e os outros, marcadamente masculinos. Dentro destes últimos encontram-se, precisamente, os pêlos. Nas palavras da investigadora “à medida que mulheres passaram a reivindicar direitos e modificar roupas e costumes a pressão para demarcar papéis de género aumentou, influenciando também na aceitação dos pêlos e de outras características que diferenciassem o masculino do feminino”.
Deste modo, ter pêlos passou a ser “sinal de virilidade” enquanto que às mulheres se impôs que se apresentassem sempre femininas e depiladas. Ao adaptar-se a estes padrões estéticos, a mulher seria assim aceite socialmente, sem tentar entrar no espaço que não seria o seu, o que seria uma “ameaça” à virilidade masculina.
O possível antagonismo que pode existir entre feminismo e depilação, terá, provavelmente, uma explicação simples: como sabemos, enquanto feministas questionamos os tão irritantes gender roles, os papéis de gênero. Com isto, basta-nos refletir: porquê sujeitarmos-nos ao que é marcadamente assumido socialmente como “feminino”? Porque é que temos que caber nesse molde cor de rosa que nos impingem e constroem à nossa volta? Exato, não temos.
Apesar de tudo isto, enquanto feministas devemos ter sempre presente que, se uma das nossas lutas é contra os papéis de género e tudo o resto que nos tenta colocar numa redoma feminina ou masculina, também temos o direito de fazer com o nosso corpo o que quisermos.
“Depila-te porque queres, não porque tens de o fazer”
Agora, espero ter esclarecido toda a tua possível confusão. Se somos pela liberdade, que não fiquemos a meia nau. Quanto ao teu corpo, pensa no seguinte: Se achas que a depilação te é imposta pelo patriarcado e que isso não funciona para ti, estás certo. Por outro lado, se a depilação, mesmo que imposta pelo patriarcado te faz sentir melhor, estás igualmente certo. Com o teu corpo, deves fazer o que queres e o que te faz sentir melhor. Porque não, não és menos feminista por te depilares, sejas homem, mulher, transgênero, sem gênero. Lembra-te que és livre, faz com o teu corpo o que queres.
Fonte:http://www.oclitorisdarazao.com/